... " Quero dormir e sonhar

um sonho que em cor me afogue:

verdes e azuis de Renoir

amarelos de Van Gogh." ...

António Gedeão
(1956)

domingo, 19 de agosto de 2012

Verão - Tempo de Felicidade - e a arte de Matisse

Saint-Tropez é hoje local de férias de reis e rainhas, de banqueiros e armadores, de estrelas da música pop ou da 7ª arte, mas nem sempre foi assim ...
Quando, no Verão de 1904, Henri Matisse a visitou era uma aldeia desconhecida ... um lugar paradisíaco, onde se vivia em verdadeira comunhão com a natureza.
As sucessivas viagens de Matisse ao Sul da França fizeram-no descobrir a luz mediterrânica, que irá dominar toda a sua obra.

O primeiro contacto que este pintor teve com esta luz foi no início de 1898, numa estada na Córsega e que depois se repetiu em visitas a Saint-Tropez e a Collioure, um pequeno porto da Catalunha francesa.
Estes encontros com a luz do Mediterrâneo influenciaram-no na cor e na pincelada.
Matisse, tal como aconteceu com van Gogh e muitos outros pintores do Norte, deslumbrou-se com a alegria do Sol do Midi, mas soube controlar esse deslumbramento, filtrando-o através da pintura de cortinas e persianas semi-cerradas que dão ao interior das casas frescura, ao contrário de muitas estradas escaldantes eternizadas nos quadros de van Gogh.

Muitos quadros de Henri Matisse, expostos no Salão de Outono de 1905, são deste período de descoberta da luz mediterrânica, mas desencadearam uma crítica feroz na imprensa e na opinião pública. O crítico de arte Vauxcelles apelidou os artistas que expuseram neste Salão de "fauves" - "feras". Este epíteto foi usado devido às cores expressivas e ao traço selvagem e desenfreado utilizado por estes pintores.
Os fauvistas deram plenos poderes à cor, emanciparam a cor face à realidade. Matisse definia o fauvismo como a "procura da intensidade da cor, sendo a matéria indiferente", mas acrescentava que o fauvismo não se resumia ao emprego das cores puras, o importante era colocar-se longe das cores de imitação e através do uso das cores puras conseguir reacções mais fortes.
Henri Matisse utilizou o fauvismo como uma etapa do seu trabalho, sabendo tirar partido das experiências vividas, indo mais longe e conseguindo, entre 1906 e 1917, aprofundar as suas investigações sobre a cor e executar obras extremamente originais.

Uma das suas obras mais célebres deste período intitula-se: "Felicidade da Vida"


Henri Matisse
"Felicidade da Vida" ou "A Alegria de Viver"
1905-1906
Óleo sobre tela - 241x175 cm
Merion,
Pensilvânia, Barnes Foundation


Escolhi este quadro de Matisse, para ilustrar este tempo de veraneio, do "dolce fare niente", do descanso e de felicidade, que os homens do centro e norte da Europa tanto apreciam para fazer férias. Como "invejam" e gostariam de ter esta luz mediterrânica! Mas não nos queiram mal por esta abençoada luz...

Na obra "Felicidade da Vida", Matisse recupera a utilização da paisagem pastoral, utilizando cores brilhantes (típicas dos fauvistas) e linhas serpenteadas (da Arte Nova).

Pinta dezasseis figuras numa paisagem idílica.
Estas personagens estão felizes.

Neste quadro sente-se a " nostalgia de um paraíso perdido onde não existem nem trabalho nem obrigações, nem vestuário nem tristeza. As personagens nuas sonham, dançam, tocam gaita, colhem flores, enlaçam-se ou, simplesmente, gozam a sua beleza e a beleza do mundo. A cor, sempre resplandecente, está desta vez repartida por vastos planos, apenas animados, aqui e ali, por certos acentos, como os traços que figuram a relva no primeiro plano.
Os ritmos são fortemente marcados por longas sinuosidades que indicam os troncos das árvores e as grandes massas das folhagens que se unem em abóbada por cima da cena, como pelo contorno dos corpos rodeados de linhas insistentes. Pela primeira vez, estas linhas do contorno das figuras afastam-se deliberadamente da verdade anatómica para se sujeitarem à organização geral do quadro, reagindo umas em relação  às outras. Não se pode omitir certo maneirismo para algumas figuras e peso para outras. Por fim, nota-se que vários rostos são sugeridos por uma simples oval, sem indicação de olhos, de nariz ou de boca, abreviação extrema a que Matisse recorrerá de novo no fim da sua carreira." *

O quadro " Felicidade da Vida" provocou sensação quando foi exposto pela primeira vez em público em 1906, e hoje como seria?  Que "pecado" haverá em os povos do Mediterrâneo aspirarem a ser felizes?

* Guichard-Meli, Jean - "Matisse", Editorial Verbo, Mem-Martins, 1983

6 comentários:

  1. Conforme anuncia o quadro aqui reproduzido, constata-se em Matisse uma alegria de viver, mesmo quando já confinado a uma cadeira de rodas utilizava o guache recortado.As janelas,as naturezas-mortas,as odaliscas serão sempre um bálsamo para as agruras da vida e invernos dela.Obrigado por no-lo sublinhar.
    Cumprimentos.
    José

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    1. Olá José, já sentia saudades dos seus amáveis comentários. É sempre agradável saber como chego aos visitantes deste blogue. Bem-haja.
      Um abraço.

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  2. O blog é magnifico, são blogs como este que deviam ter centenas de seguidores.
    Gostei muito deste post sobre Matisse, principalmente a parte sobre a sua variante fauvista. Parabéns.

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    1. Obrigada pelo seu simpático comentário. Sinto-me lisonjeada pela sua apreciação, que me dá ânimo para continuar a merecer o seu interesse e as suas visitas a este blogue.

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  3. Uau, isso parece incrível. Devo dizer que pinturas a óleo estão se tornando mais famoso agora dias, devido à sua maior preservação e belezas. Eu sugiro que você tome parte na conversa com colegas de outros para aumentar o tráfego para este blog. Você tem um blog maravilhoso com muito potencial. Continue assim.
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  4. Muito obrigada por este comentário tão estimulante e pela sugestão.

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