... " Quero dormir e sonhar

um sonho que em cor me afogue:

verdes e azuis de Renoir

amarelos de Van Gogh." ...

António Gedeão
(1956)

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Retrato (s) ... Auto-Retratos de Van Gogh - IV

Voltar aos auto-retratos de Van Gogh é um privilégio para mim ... escrever sobre este pintor genial, que assinava os seus quadros com um simples nome próprio: Vincent, emociona-me...
Da pesquisa que fui fazendo apercebi-me que por detrás de uma obra excepcional está um homem íntegro, cheio de "bondade e compaixão" como escreveu o pintor Bernard, "um homem honesto ..." como recordou, no seu funeral, o médico que o acompanhava, o Dr. Gachet. Mas Van Gogh foi também um homem sofredor, acometido de terríveis medos e ansiedades.
Numa, das muitas cartas, que dirigiu ao seu irmão Theo afirmou: "Estou, uma vez mais, próximo da (...) loucura (...). Se não tivesse uma espécie de dupla personalidade, uma de monge e outra de pintor, já me encontrava há muito no estado que referi".
Seis meses após escrever esta carta aceitou esse estado de loucura entrando para um mosteiro: o de Saint-Paul-de-Mausole, um hospício em Saint-Rémy, mantendo, no entanto, a sua vida artística intacta.


Em Saint-Rémy ,Van Gogh continuou a pintar, são deste período os auto-retratos que coloco neste post.



Van Gogh
"Auto-Retrato"
Óleo sobre tela - 57x43,5cm
Saint-Rémy, fins de Agosto de 1889
Nova Iorque
Colecção Mrs. Jonh Hay Whitney

Mais uma vez se representa com a cabeça muito magra.
Neste auto-retrato estão evidentes sinais dos conflitos interiores. Agora o seu rosto aparece mais pálido do que o habitual, de um verde amarelado, descorado, mostrando com fidelidade o seu aspecto.
É de realçar que Van Gogh se faz acompanhar neste quadro, dos seus atributos de artista (pincéis e paleta) para nos revelar a sua profissão, auto-afirmando-se como artista.
Neste auto-retrato,os seus olhos fogem dos nossos, há alguma cautela, mesmo resistência em nos olhar nos olhos.
O olhar do artista não está voltado para o exterior, mas para o seu interior, olhando o seu mundo imaginário.



Van Gogh
"Auto-Retrato"
Óleo sobre tela - 65x54cm
Saint-Rémy, Setembro de 1889
Paris, Museu d'Orsay

Depois de deixar o hospital para doentes mentais, em Saint-Rémy-de-Provence, pintou um auto-retrato em que a cor escolhida reflecte o seu estado emocional, a luta que está a travar com os seus próprios demónios.
O rosto surge carrancudo, quase zangado. À volta do nariz e das maçãs do rosto há rugas bem vincadas. As sobrancelhas são grossas e salientes, os cantos da boca aparecem voltados para baixo.
O ritmo das suas pinceladas através de linhas serpenteadas em forma de remoinho (uma das características de algumas das suas obras) aparece no rosto e nas roupas, expandindo-se com grande agitação no fundo azul-gelo.
Os azuis frios e verdes contrastam com o cabelo e a barba em tom vermelho. É este contraste que dá o tom psicológico ao quadro.
O seu rosto demonstra que passou por vários perigos e muita tormenta psicológica.



Van Gogh
"Auto-Retrato"
Óleo sobre tela - 51x45cm
Saint-Rémy, Setembro de 1889
Oslo, Nasjonalgalleriet

Este é o auto-retrato mais desfigurado, cruel e impiedoso de todos os que pintou. O seu rosto é semelhante ao dos camponeses que pintou no início. Nele regressa ao uso de camadas espessas de tinta de cor terra barrenta. Neste quadro não há cores brilhantes, pelo contrário, há falta de luz.
Van Gogh apresenta-se com a orelha mutilada e no rosto com um ar quase ameaçador.
O artista parece rejeitar a sua própria imagem como motivo a retratar.

O fim aproxima-se ...

6 comentários:

  1. Alguns afirmam que a loucura de Van Gogh é por causa do cheiro da tinta.

    Enfim, eu acho que isso é uma tremenda mentira...

    Boa sorte!

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  2. Muito interessante este seu longo trabalho
    sobre os auto-retratos de Van Gogh.
    José

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  3. Fico satisfeita por ter apreciado estes posts.
    Obrigada.
    Eva

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  4. Parabéns pelo teu trabalho, continua!
    Particularmente interessante esta análise evolutiva sobre os auto-retratos de Van Gogh e o paralelismo que se estabelece com os seus estados psíquicos. Fiquei com vontade de saber mais...
    Beijinho com muito orgulho de ti.

    J. André

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  5. Van Gogh é um artista fascinante. Sua pintura reflete de tal forma a sua alma que não conseguimos observar seus quadros com indiferença. No penúltimo quadro aqui do post, note o pequeno corte em seus lábios, o filete vermelho. Os detalhes em suas obras são sempre mágicos. Muito bacana o seu texto, parabéns.

    No link abaixo, dá para ver 4 dezenas de autorretratos de Van Gogh, vale a pena.
    http://abstracaocoletiva.com.br/2013/01/27/retratos-e-autorretratos-de-vincent-van-gogh/

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    1. Nem imagina como fiquei feliz com o seu comentário.Concordo com a sua afirmação "Van Gogh é um artista fascinante".Obrigado pelo link que me indicou.Gostei muito.

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