sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Ícaro de Matisse - a alegria da cor ou puro engano

Todos... todos são muita gente... mas mesmo assim acho que todos temos aspirações para as nossas vidas, como Dédalo, pai de Ícaro, e ao mesmo tempo uma dose de insensatez como este, que descurou os sensatos conselhos paternos.

Na mitologia grega , Dédalo era um engenhoso artífice. Originário de Atenas, por razões várias, foi encarcerado, com o seu filho  no Labirinto do Minotauro em Creta, de onde só era possível fugir pelo ar. Mas Dédalo sabia isso muito bem, pois foi ele que projectou o Labirinto, palácio de intrincados corredores. Então, sempre engenhoso, criou umas asas com penas e cera para si e para o seu filho, Ícaro, fugirem de lá.
Entretanto Dédalo avisou o filho que não voasse demasiado alto. Ícaro descurou o aviso do pai, advindo daí trágicas consequências. As asas não aguentaram o calor dos raios solares, a cera derreteu  e Ícaro caiu no mar.

"Dédalo e Ícaro têm sido representados inúmeras vezes na literatura e na arte, constituindo o seu voo um símbolo do espírito inventivo e das aspirações do homem, enquanto a queda de Ícaro encerra uma alegoria da insensatez ou da juventude". *


Henri Matisse
"Ícaro"
1943
Maqueta para "Jazz", publicado pela primeira vez em 1947
Guache sobre papel cortado, 40,5x27 cm
Musée National d´Art Moderne - Centre Georges Pompidou
Paris

Henri Matisse foi um dos muitos artistas que representaram o mito de Ícaro.
Uma grave doença deixou Matisse imobilizado durante algum tempo, o que não o desencorajou  de continuar a trabalhar e teve "o engenho e a arte" para desenvolver um nova técnica, na qual pedaços de papel pintado eram recortados e montados de modo a compor uma imagem. Os exemplos mais famosos da sua técnica estão representados no livro "Jazz", publicado por Matisse em 1947.

A obra "Ícaro" é uma mistura da pintura de um fundo azul brilhante, executado com pinceladas largas, formando o cenário onde figuras de amarelo brilhante e negro de breu recortadas são colocadas em queda livre.

A aparente alegria desta obra, transmitida através do uso de cores e imagens brilhantes que o artista diz, nas suas Memórias Pessoais, derivarem "...de cristalizações de memórias do circo, contos populares ou viagens", escondem preocupações, ansiedades, alienações provocadas pela II Guerra Mundial.

Matisse baseou-se no mito de Ícaro, descrito nas "Metamorfoses" de Ovídio, mas actualizou-o.

A figura negra que atravessa o céu em queda livre, na obra de Matisse não é um qualquer incauto que se aproxima demasiado do Sol, apesar dos conselhos paternais, pelo contrário, a figura negra com um círculo vermelho brilhante no lugar do coração "sugere que se trata de um piloto moderno que foi abatido e vai caindo ao longo do céu iluminado pelos disparos das armas. O Ícaro de Matisse é um herói moderno, um mártir cuja queda simboliza a destruição da vida e da esperança no meio do arsenal de guerra moderno". **

* Lodwick, Marcus - "Guia do apreciador de Pintura", Editorial Estampa, Lisboa, 2003
** O`Mahony, Mike-"O Estilo Internacional" - in História da Arte no Ocidente - Editorial Verbo, Lisboa, 2006

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